As pessoas podem pensar que eu tenho algum envolvimento no envenenamento dos meus filhos, mas não tenho. A Cíntia Mariano, minha esposa e acusada de envenená-los, não demonstrava que faria isso. Fico com um sentimento de revolta e culpa por me envolver com um monstro. Mas eu não tinha bola de cristal. Até briguei com Deus , perguntei a Ele por que tirou a minha filha. Mas não foi Deus. Foi quem estava do meu lado. Infelizmente eu não sabia. Se você convivesse com ela, não perceberia. Ela acolheu 38 crianças em um projeto de mãe acolhedora da prefeitura. Não tem como entender o que passou pela cabeça dela. (Adolescente que teria sido envenenado pela madrasta fala pela primeira vez sobre o crime: “Ela fazia tudo para o meu pai brigar comigo”)
Cíntia Mariano Dias Cabral teve a prisão decretada — Foto: Reprodução
Nós nos conhecemos porque ela fazia o transporte escolar do meu filho. Estamos juntos há quatro anos e durante a pandemia nos casamos. A Cíntia conhece o Bruno, de 16 anos, desde os 5 anos de idade. Sempre fui um pai presente e tínhamos uma vida normal de casal. Com meu filhos nunca tinha percebido ela demonstrar ciúmes, mas com a minha ex-mulher, sim. Mas agora, olhando para trás lembro que o Bruno se desentendeu algumas vezes e relatou algumas coisas estranhas, como o sumiço da carteira. E ela uma vez apagou uma conversa minha com ele no WhatsApp. Na ocasião, ela disse que apagou a mensagem porque se não iria lá na casa da mãe dos meus filhos pegá-lo. Ela se dava muito bem com o garoto, e eu falei que tinha ficado chateado e pedi para ela não fazer mais isso. Inclusive sugeri que, se ela quisesse, poderia me acompanhar quando fosse lá.
Com a Fernanda, que tinha 22 anos, ela já teve um bate-boca, mas também teve com a filha dela… Coisas que acontecem em qualquer família. Com meus filhos nunca percebi algo fora do comum. Não tinha como perceber essas coisas, os amigos dela vão te falar a mesma coisa: ninguém acredita que ela pudesse fazer alguma coisa dessas, mas fez.
Perfil de madrasta suspeita de envenenar os enteados em rede social era cheiode homenagem
Minha filha era um anjo. A Fernanda tinha uma vida fitness, pesava muitos os alimentos para comer a porção certa e por isso etiquetava algumas comidas na geladeira com o nome dela. No dia em que ela passou mal, logo depois de jantar, ela veio ver o jornal comigo na televisão. Algum tempo depois, me disse que não estava se sentindo bem e foi ao banheiro. A Cíntia foi logo depois e voltou dizendo que ela estava passando muito mal.
E durante a internação da Fernanda, a Cíntia foi uma atriz. Ela ajudou o tempo todo. Todos os dias ela me via orando no quarto, de joelhos, pedindo pela minha filha. Ela viu isso tudo e não falava. Como os médicos deram a entender que ela tinha morrido de causas naturais, não tinha ideia do que tinha acontecido.
Quando você perde uma filha, fica maluco. A morte dela me fez redobrar o cuidado com meu filho, fiquei mais chato ainda do que já sou, ligando toda hora para ele. Então, naquele 15 de maio, depois de sair de um simulado na escola, fui buscar o Bruno de carro naquele domingo. A Cíntia preparou o almoço e o feijão era o carro chefe dela na cozinha. Estávamos todos na mesa comendo e o Bruno sentiu um gosto amargo no feijão. Quando ele comentou, a Cíntia pegou o prato por duas vezes para botar mais feijão. O Bruno percebeu algo no prato, mas ela disse que era o tempero, daqueles prontos, que não tinha derretido durante o preparo. E esse também seria o motivo para o amargo do feijão. Ali começou a desconfiança. Ninguém achava que ela estava envenenando, mas todos estranharam a atitude dela, que foi muito suspeita.
Depois do almoço , ele pediu para voltar para casa da mãe. Uma hora depois de deixá-lo, minha ex-esposa me ligou, pedindo para eu ir correndo lá porque ele estava passando mal com os mesmos sintomas da Fernanda. Fiquei louco, pensando que iria perder mais um filho num intervalo de dois meses. A Cíntia mesmo foi dirigindo o carro para o hospital, e, quando chegamos à unidade começamos a desconfiar.
Graças a Deus deu tempo de salvarmos o Bruno, que fez lavagem estomacal. Hoje ele está em casa e também tem certeza sobre o que aconteceu com ele. O Bruno lembra que não se sentiu bem com a comida. Quando chegou à casa da mãe, começou a suar frio nas mãos, a vista fica embaralhada e babar.
Quando voltamos para casa, já não consegui dormir no mesmo quarto. Falei pra ela “tu fez alguma coisa”. A Cíntia começou a chorar e negar, dizendo que era impossível. Não consegui dormir e pela manhã decidi sair de casa. Foi quando o delegado me chamou para prestar um depoimento. Quando comentei com a Cíntia que iria à delegacia, ela pediu para ir junto, mas decidi ir sozinho.
Depois de contar tudo o que tinha acontecido, o policial perguntou se me importava de deixá-los revistar na minha casa. Nesse momento olhei meu celular e vi que ela tinha mandado mensagens dizendo que estava na porta da delegacia já. O policial então pediu para ela aguardar. Saímos pela porta de trás, sem ela ver, e fui com alguns agentes até a minha casa. Lá eles vasculharam e encontraram embaixo de panos de fogão remédio para pulgas de cachorro. Ali eu peguei minhas roupas e botei dentro de um saco. Não tinha mais condições de olhar para a cara dela.
Tenho que continuar a lutar, porque financeiramente eu sou o provedor da família. Por isso, tenho que ficar bem por aqui. Se acontecer alguma coisa com meu trabalho, não tem como continuar o sustento. Ainda fico nervoso com a história toda e estou precisando tomar remédios para me acalmar. Vou vivendo, trabalhando como dá.
Fonte O GLOBO