Às 02.59 do dia 13 de abril de 1970 o astronauta Jack Swigert comunicou ao Centro de Controlo da Missão Apolo 13 que tinha havido uma explosão na nave espacial em que os três astronautas se dirigiam para a Lua. Disse: “Houston, we have a problem.” Foi essa a frase que ficou para a história apesar de a verdadeira ter sido: “Okay, Houston, we”ve had a problem here.” O trio norte-americano salvou-se de um fim trágico após vários dias de grande incerteza, em manobras orientadas desde a Terra, onde milhões assistiam ao desenrolar da odisseia Apolo – que tinha como número o 13, que muitos acreditam ser de grande azar – e a NASA tornou-se uma instituição ainda mais respeitada por ter saído bem dessa mais que provável tragédia.
Quatro décadas depois, a NASA teve de vir de novo em socorro do homem, não de três astronautas mas de toda a população do planeta porque foi dado como certo – na medida em que isso era possível – por vários profissionais das teorias da conspiração que o mundo iria acabar a 21 do 12 de 2012. Fizeram contas em cima do calendário dos maias e “descobriram” que esta civilização centro-americana prognosticava o fim do mundo para esse dia.
Nada aconteceu, e esses profetas e conspiradores deixaram passar mais algum tempo para nas últimas semanas apresentarem novas contas e apontarem amanhã, 21 de junho de 2020, como o dia em que o apocalipse acontecerá finalmente.
Perante a alegada ameaça do anterior cataclismo, a NASA explicou no seu site nos dias antes que era preciso dar ouvidos à ciência e que esta não previa nada fora do normal para o planeta Terra. Aliás, no dia seguinte, publicou uma “notícia de última hora” com o título “O mundo não acabou a 21 do 12 de 2012”. Acrescentava o seguinte: “Como se devem ter apercebido, a profecia maia estava errada desde o princípio.”
Poucos anos depois, fez uma atualização desse desmentido, novamente por causa das profecias dos maias: “Várias pessoas previram o fim do mundo para 20 de setembro de 2017, data em que um misterioso planeta entraria em colisão com a órbita da Terra. Esse planeta, Niburu, não existe e é uma história que se propagou sem razão de ser.”
Mas nada impede que novas previsões apocalípticas desafiem as explicações da NASA, que mantém no seu site estes esclarecimentos ao lado daquilo que é a sua razão de existir, a exploração espacial, mantendo a sua oposição contrária ao que os especuladores dizem existir no calendário maia.
Desta vez, coube a um alegado cientista norte-americano, Paolo Tagaloguin, que colocou na sua conta do Twitter esse alerta sobre o fim do mundo em breve. Aviso: não vale a pena procurar porque nos últimos dias essa conta e todas as outras que tinha nas redes sociais foram apagadas – nem se sabe até que ponto Tagaloguin existe ou é ficção. Seria boa a sua intenção de preparar milhões de milhões de seres humanos para o dia do juízo final, afinal os maias tinham feito essa previsão há milénios e estava a chegar a hora de o planeta se confrontar com o seu destino.
Mas a NASA já tinha desmentido qualquer validade do antigo calendário maia e, ainda por cima, as contas estavam mal feitas mais uma vez. E, após ter desmentido essa mesma previsão no início deste milénio e, principalmente a data do fim do mundo para 12 do 12 de 2012, referiu que o engano já tinha começado em 2000, 2003 e 2006, outras datas apontadas para o cataclismo final. Que geraram medo, principalmente a de 2012, que teve o benefício de uma campanha mundial muito bem orquestrada que vendeu muitos livros e ocupou muitos espectadores em horas de programas televisivos sobre o seu fim próximo.
Daí que a NASA não precisasse de ouvir a frase “Houston, we have a problem” para intervir e ter vindo a público novamente demonstrar a falibilidade dessas teorias e negar qualquer credibilidade nas previsões. E nos últimos dias essas palavras voltaram a ser recordadas, de forma a sossegar os milhões que ainda acreditam nessas fantasias que regressam periodicamente, como agora.
Factos: tudo terá começado numa notícia no jornal (tabloide) britânico The Mirror, publicada no passado dia 12 e que, entretanto, foi apagada do seu site. E tudo terá mesmo começado com um tweet de Paolo Tagaloguin a revelar que existia um erro de cálculo na adaptação do calendário maia em relação ao gregoriano, que a maior parte do planeta utiliza, e que teria adiado o apocalipse para amanhã. A partir daí, as redes sociais foram fazendo o seu papel e muitos jornais publicaram artigos sobre o novo fim do mundo. Mesmo que dar fogo a esta previsão tivesse sido uma prioridade para órgãos de comunicação social popularuchos como muitos no Brasil e na Índia, também o espanhol La Vanguardia deu destaque nesta semana ao fim do mundo.
A tese do alegado cientista e alegado norte-americano Paolo Tagaloguin resumia-se ao “facto” de que refeitas as contas existiam 2948 dias a acrescentar à anterior previsão, a de 21 do 12 de 2012. Segundo o The Mirror, Tagaloguin teria avisado no Twitter que “se se seguisse o calendário juliano, o ano em que estaríamos tecnicamente seria o de 2012. Ao fazer a passagem para o calendário gregoriano, perderam-se a cada ano 11 dias entre 1752 e 2020. Ou seja, os tais 2948 dias que coincidem com este 21 de junho.
A crer nesta nova contabilidade, tudo aconteceria já neste domingo. No entanto, houve quem fizesse essas mesmas contas do “cientista” Tagaloguin e encontrasse várias discrepâncias na mudança dos calendários juliano para o gregoriano e, pior, que o anterior dia do apocalipse, o de 21 de dezembro de 2012, já estava errado na conversão dos referidos calendários juliano para o gregoriano, em cima do calendário maia que serviu de inspiração original. Mais, os maias não utilizavam uma contagem do tempo como aquelas para que o seu calendário foi convertido, daí que qualquer previsão futura não passe de uma especulação.
Talvez este apocalipse tivesse tido mais popularidade se não fosse o efeito da quarentena devido à pandemia da covid-19, essa sim um verdadeiro apocalipse global!
No entanto, várias autoridades foram ouvidas nos últimos dias para esclarecer a probabilidade do fim do mundo segundo os maias. E o que acontece é uma quantidade de desmentidos pois, além de a NASA já ter afirmado que “estas teorias não passam de mentiras sem qualquer prova que sustente as conspirações nos livros publicados, documentários ou em tudo o que corre na internet”, também um responsável da Astronomia do Dubai veio dizer que “a ciência requer um esforço para ser compreendida e esta é uma oportunidade de ouro para as pessoas não acreditarem neste tipo de mensagens”.
Outros especialistas recordam que a civilização maia jamais se preocupou em prever o fim do mundo e que esta data assume importância no seu calendário porque representava o fim de um ciclo do tempo, como o de o ano acabar em dezembro. Opinião que um astrónomo da Universidade de Maryland, John B. Carlson, já explicara ao afirmar que o calendário maia não terminava a 21 de dezembro de 2012 nem continha previsões apocalípticas, e que essas deduções eram “um engano e uma leitura incorreta do calendário”. Que, referiu, regride na contagem do tempo a antes do Big Bang e que coloca a criação do mundo há pouco mais de cinco mil anos.
Fonte: Diário de Notícias