Uma empresária de 37 anos, moradora de Niterói, no Rio, quase perdeu a visão há dois meses, após um procedimento estético. Em dezembro, Deusa Kannon pagou R$ 380 por um “alongamento de cílios 3D” em um salão da cidade, mas acabou tendo o olho atingido por uma supercola utilizada no procedimento, o que ocasionou uma grave lesão em sua pálpebra.
Ao BHAZ, ela conta que a esteticista que a atendeu ainda tentou remover o produto com acetona, o que acabou gerando uma queimadura de segundo grau.
“Ela saiu para atender a filha dela no telefone e voltou muito agitada, esbarrando em algumas coisas que estavam próximas da minha testa. Tinham três potinhos de supercola que ela usa para os cílios. Ela disse que esse era um procedimento novo, pois os clientes estavam reclamando da durabilidade dos cílios e com essa super cola eles duravam mais”, relata.
Ainda segundo Deusa, o olho esquerdo dela foi atingido pelo produto e, na tentativa de remover a cola, a funcionária teria aplicado acetona – substância corrosiva comumente utilizada na remoção de esmalte das unhas. Neste momento, a cliente conta ter sentido uma grande ardência nos olhos.
“Aquilo no mesmo momento causou uma reação química fortíssima que eu não sei nem explicar. Deu uma queimadura de segundo grau, uma dor imensa, absurda”, acrescenta.
‘Colocou uma toalha na minha cara’
Além do erro durante o procedimento, a empresária afirma que não recebeu o suporte adequado do estabelecimento. Enquanto pedia para a funcionária chamar por socorro, Deusa conta que ela se negou repetidas vezes, alegando que teria que conversar com a gerente primeiro.
“Pedi socorro e ela disse que não ia chamar a ambulância, pois a maca não subia no segundo andar. Pedi pra ela ligar pra minha companheira e ela disse que não precisava, que ia dar um jeitinho. Em outro momento, ela disse que não podia chamar ninguém, pois tinha que falar com a gerente. Ela chegou a colocar uma toalha na minha cara, pra me esconder”, relata, com indignação.
Após alguns minutos, os bombeiros do shopping chegaram ao local para prestar os primeiros socorros. Nesse momento, a cliente conseguiu ligar para a família.
“Meu rosto estava tão desfigurado que o reconhecimento facial [do celular] não tava funcionando. Com muito custo consegui desbloquear e ela [a funcionária] chamou minha companheira, que veio, com o joelho fraturado, para me buscar”, relembra.
Cirurgia
Chegando ao hospital, ao lado da esposa e do filho mais velho, Deusa recebeu a boa notícia de que sua córnea não foi comprometida pela mistura de substâncias. Após a avaliação de uma cirurgiã-geral, no entanto, a mulher foi informada de que teria que passar por uma blefaroplastia – cirurgia de reconstrução da pálpebra.
“Ela disse que eu tava com lesões cutâneas, queimaduras de segundo grau que viraram úlceras abertas. Essa cirurgia foi de risco, pois eu não tinha idade para fazê-la, já que ela se utiliza da nossa própria pele. Eu precisaria ter, no mínimo, uns 15 anos a mais para ter pele o suficiente”, relata.
Segundo Deusa, o procedimento correu bem, mas nem por isso a vida dela voltou ao normal. Mesmo passados dois meses de todo o susto, a mulher conta que ainda tem dificuldade para dormir e não consegue trabalhar ou exercer tarefas básicas do dia a dia.
“Eu não consigo fechar os olhos pra dormir porque eu tenho medo, já tive pesadelos, tenho feito tratamento psicológico. Tem me afetado muito tudo isso. Minha companheira tá muito abalada. Acabou de passar o aniversário de um ano da nossa filhinha e eu disse que não ia fazer festa nenhuma, porque tô igual um monstro”, conta ela, com tristeza.
Alongamento de cílios é seguro?
Para saber quais os riscos do alongamento de cílios, o BHAZ conversou com a médica dermatologista Karla Mendes, do Hospital Semper. Segundo a especialista, o procedimento não é recomendado, porque pode ocasionar uma queda dos fios, além de alergias e irritações.
“O alongamento de cílios, pela visão dermatológica, não é algo indicado porque o cílios é um pêlo que tem um ciclo evolutivo demorado. Então, às vezes, ao colar o cílios, você pode ter uma queda e demora muito tempo até que ele cresça novamente”, explica.
“A pele da pálpebra, ela é a pele mais fina que a gente tem no corpo e o cílio é um anexo cutâneo, então ele é muito sensível também. A cola por si só, dependendo de qual for, já aumenta o risco de doenças dermatológicas, seja de reações como dermatite de contato, às vezes até alérgicos ou por irritação primária”, acrescenta a dermatologista.
Cuidados são necessários
Já o médico oftalmologista do Hospital Semper e membro do Conselho Brasileiro de Oftalmologia, Thiago Carvalho Barroso, explica que é preciso ter muito cuidado ao manusear determinados produtos que possam tem contato com os olhos. Em caso de acidentes desta natureza, o ideal é procurar uma unidade médica o mais rápido possível.
“De maneira geral, o ideal é sempre procurar o atendimento médico de urgência. Caso isso não seja possível, você deve lavar abundantemente os olhos com soro fisiológico ou, na falta dele, com água corrente. Na cultura popular existe o hábito de colocar algumas substâncias, plantas, leite materno, mas a orientação é procurar um médico”, enfatiza Thiago.
O tratamento oftalmológico varia de acordo com a substância, por isso, o ideal é se atentar a qual produto que provocou a irritação. “É importante saber qual substância provocou o acidente para que se possa tomar a melhor conduta”, ressalta o especialista.
Mobilização nas redes
Na última semana, a esposa de Deusa, Luciene Assis, tem se esforçado para tornar o caso público. Em suas redes sociais, ela compartilhou dezenas de fotos e vídeos da companheira que evidenciam a gravidade dos ferimentos.
Um dos vídeos, que já soma mais de 2 milhões de visualizações e 3 mil comentários, mostra Deusa chorando ao tentar remover a cola dos cílios. Além de formalizarem uma ocorrência policial contra o estabelecimento, as duas entraram na justiça para obter uma retratação.
“Meu intuito é que eles viessem se retratar comigo, porque eu frequento esse shopping há mais de 15 anos e hoje eu sinto vergonha de entrar ali. E o erro não foi meu. Já conhecia o salão, já tinha feito unha, outros procedimentos, sabia que era um salão de primeira, renomado”, conta a empresária.
O BHAZ entrou em contato com a Polícia Civil do Rio de Janeiro para saber o andamento do caso, mas até o momento não obteve retorno. Tão logo a corporação se manifeste, esta matéria será atualizada.
O que diz o salão?
Durante a tarde desta quarta-feira, a reportagem também entrou em contato, por telefone e WhatsApp, com o salão onde Deusa fez o procedimento. No fim da tarde, uma atendente informou que o caso não está sendo conduzido na unidade e disse que encaminharia o contato para a pessoa responsável. Até o momento, no entanto, o estabelecimento não retornou e também não respondeu novas tentativas de contato da reportagem.
Ao Uol, o salão de beleza disse que as denúncias levantadas por Deusa não são verídicas. “As acusações foram feitas com o intuito de desmoralizar não só a empresa, como também nossa funcionária —uma profissional altamente qualificada”, diz a nota enviada ao portal.
O BHAZ também entrou em contato com o shopping onde fica o salão, que afirmou que não vai se pronunciar sobre o episódio.
Fonte BHAZ