Moradores do Complexo do Salgueiro, em São Gonçalo, região metropolitana do Rio de Janeiro, acusam a Polícia Militar de chacina após retirarem ao menos 11 corpos com marcas de tiro de uma região de mangue da comunidade, na manhã desta segunda-feira (22). Nenhum dos corpos foi identificado até o momento.
A Polícia Militar afirma que as vítimas morreram em um confronto, ocorrido em uma operação realizada um dia após a morte de um policial. Mas a versão dos moradores contradiz a versão oficial. Uma moradora, em relato ao UOL, afirma que viu um dos homens “degolado” e com as mãos para cima.
O que diz a PM
Houve uma ação do Bope (Batalhão de Operações Especiais) contra traficantes no domingo (21), um dia após um policial militar ser morto na região. Segundo a PM, Leandro Silva morreu quando equipes do Batalhão de São Gonçalo foram atacadas perto de uma área de mangue.
A ação de domingo ocorreu após a PM receber informações de que um dos homens responsáveis pelo ataque que vitimou Leandro ainda estava ferido no interior da comunidade. A corporação afirma que foi até o conjunto de favelas para uma operação de “estabilização”.
Moradores falam em chacina
Uma moradora de outro ponto da comunidade, que não será identificada, disse que mensagens circulam em aplicativos de mensagens relatando que muitos mortos foram achados na região.
Falam em muitos mortos no interior do mangue, pedem ajuda para retirar, famílias estão desesperadas procurando filhos e outros parentes. Eles falam em chacina. Muita gente nem saiu de casa para trabalhar.
Outro morador afirmou que se estima que podem ser achados até “15 mortos”.
Disseram que entrou um grupo grande de meninos dentro do mangue e 8 fugiram. Os meninos da comunidade têm o hábito de se refugiarem no mangue.
A PM informou que dará início a uma ação no local e permanecerá na região para garantir o trabalho de perícia da Polícia Civil. Ontem, segundo a PM, houve confronto e um homem morreu no local. A corporação afirma que ele foi reconhecido como um dos envolvidos no ataque criminoso à guarnição da PM que vitimou o sargento Silva.
Uma idosa de 71 anos também ficou ferida. Carmelita Francisca de Oliveira foi atingida no braço, levada para o hospital, medicada e liberada.
O diretor da Faferj (Federação das Associações de Favelas do Rio de Janeiro), David Gomes, informou que tem acompanhado denúncias de violência policial na comunidade do Salgueiro há meses. Há cerca de 15 dias, a federação reuniu-se com representantes do governo do Estado do Rio para pedir melhorias na comunidade.
“Naquela reunião, já denunciamos que a violência policial estava grande na comunidade e as lideranças pediam para o governo entrar na comunidade com projetos sociais e obras de urbanização. Mas o que vemos é mais uma chacina”, afirma Gomes.
PM não fez varredura após ação
O porta-voz da PM, o tenente-coronel Ivan Blaz disse ao UOL que, durante a ação, suspeitos de serem traficantes se refugiaram na área da mata e, após cessarem os supostos confrontos, não foi feita uma varredura no local devido à complexidade da região.
Eles [suspeitos] sempre recorrem à mata e atiram lá de dentro. É um confronto complexo, não dá para fazer varredura após o confronto por conta da complexidade do local. Não sabemos quem mais está ali dentro. Então, quando os confrontos cessam, as equipes deixam o local.
Segundo Blaz, foi feita uma ocupação na quinta-feira (18) na região e foram registrados confrontos durante três dias. De acordo com ele, a operação foi informada ao Ministério Público e tinha como objetivo combater a criminalidade.
“Foi uma ocupação planejada, algo necessário para impedir que a sociedade continue sendo vítima. Esses criminosos atuam muito na rodovia [BR 101]”, afirmou o porta-voz.
Segundo a PM, foram apreendidos na ação duas pistolas, 14 munições calibre 9 milímetros, 56 munições de fuzil calibre 762, cinco carregadores (dois para fuzil e três para pistola), um uniforme camuflado, 813 tabletes de maconha, 3.734 sacolés de pó branco e 3.760 sacolés de material assemelhado ao crack. A ocorrência foi encaminhada para a delegacia da área.
Defensoria ouvirá famílias
A Defensoria Pública do Rio disse que recebeu relatos sobre a operação no Complexo do Salgueiro ainda na noite de ontem. A ouvidoria comunicou o caso ao Ministério Público para adoção de medida cabíveis. A Defensoria disse ainda que está em contato com as lideranças locais prestando orientações necessárias.
O defensor público geral, Rodrigo Baptista Pacheco, disse no Twitter que o órgão acompanha o caso e que se encontrará com as famílias no começo da tarde de hoje.
“Equipes da Defensoria Pública e da Ouvidoria, em companhia de outras entidades (OAB, Alerj [Assembleia do Rio] e Faferj [Federação das Associações de Favelas do Rio de Janeiro]), irão hoje, às 14h, atender as famílias do Complexo do Salgueiro, em São Gonçalo”, escreveu ele.
Fonte UOL