Dólar cai para R$ 5 e fecha no menor valor em dez meses

Dólar cai para R$ 5 e fecha no menor valor em dez meses

Em dia de apetite por ativos brasileiros, que colocou o dólar abaixo dos R$ 5 no melhor momento desta terça-feira, e com descompressão na curva de juros, na ponta longa e na curta, o Ibovespa teve o seu maior avanço em porcentual desde 3 de outubro (então 5,54%), logo após o primeiro turno da eleição. A euforia veio ainda pela manhã, com a leitura abaixo do esperado para o índice oficial de inflação, o IPCA, que desacelerou em março e ficou abaixo do limite superior da meta no acumulado em 12 meses, algo não visto nos últimos anos. No mês, o IPCA ficou em 0,71%, abaixo da mediana das estimativas (0,77%) para março.

Assim, com a expectativa de que o Copom possa sinalizar em breve, possivelmente até mesmo no próximo comunicado, em maio, postura menos dura com relação à Selic, e perspectiva do mercado de que a taxa de juros do BC possa começar a ser cortada no começo do segundo semestre – ou mesmo no fim do primeiro -, os investidores foram às compras. Apenas dois papéis do Ibovespa (Minerva -1,29%, Taesa -0,03%) ficaram de fora da maré aquisitiva vista na sessão, com retomada também no giro financeiro, a R$ 32,2 bilhões. Ao fim, o índice da B3 mostrava alta de 4,29%, a 106.213,76 pontos, entre mínima de 101.847,79 pontos – quase igual à abertura, a 101.848,94 – e máxima de 106.455,33 pontos

Foi o melhor nível intradia desde 9 de março e o maior patamar de encerramento desde o dia 8 daquele mesmo mês. Na semana, o Ibovespa acumula ganho de 5,35%, passando ao positivo em abril (+4,25%), mas ainda cedendo 3,21% no ano.

“O dia foi bem favorável tanto para câmbio como para juros, em que a parte mais curta da curva ficou menos pressionada com a leitura sobre o IPCA, mais fraco do que o esperado. Contribuíram também declarações do secretário do Tesouro, Rogério Ceron, sobre a regra fiscal, dando mais detalhes e esclarecendo algumas dúvidas sobre a interpretação da proposta, principalmente as relacionadas ao crescimento dos investimentos em relação às receitas”, diz Luciano Costa, sócio e economista-chefe da Monte Bravo Investimentos.

Na B3, as ações de primeira linha, como as de commodities (Vale ON +5,28%, Petrobras ON +4,39% e PN +4,69%) e do setor financeiro (Bradesco PN +5,24%, na máxima do dia no fechamento; Itaú PN +3,24%), avançaram com força na sessão, enquanto a ponta do Ibovespa foi carregada por papéis com ganhos na casa de dois dígitos: Gol (+17,13%), Azul (+13,81%), Magazine Luiza (+12,84%), Hapvida (+12,77%), CVC (+11,62%), Cogna (+11,30%) e Yduqs (+10,06%).

O dia chegou ao fim com retomada tanto nas ações com exposição à economia doméstica, como as do índice de consumo (+5,81%), quanto nos papéis com preços e demanda formados no exterior, como os do índice de materiais básicos (+4,60%), que reúne as ações de commodities.

“Papéis com maior Beta mais voláteis, aqueles que costumam amplificar o respectivo grau de ajuste, seja de alta ou baixa, ante o observado no índice de referência, sensíveis ao ciclo e que sofreram mais no último período, foram os mais beneficiados na sessão, como companhias aéreas e nomes do varejo e serviços como Magazine Luiza e Localiza (ON +9,17%)”, observa Luiz Adriano Martinez, sócio e gestor de renda variável da Kilima Asset, destacando o fluxo da sessão, possivelmente reforçado por estrangeiros pelo que se viu de desempenho nos papéis de maior capitalização de mercado, como Vale e os bancos privados.

“Não havia dúvida de que a Bolsa brasileira está muito barata, por alguns critérios no menor nível em duas décadas, mas estava faltando notícia boa para induzir recuperação, o que veio hoje com o IPCA em 12 meses abaixo do limite superior da banda de flutuação, considerando a meta oficial do CMN (Conselho Monetário Nacional), buscada pelo Copom. Com tudo mais constante, é possível que haja espaço para o BC começar a cortar a Selic ali por agosto”, diz Bernard Faust, operador de renda variável da One Investimentos.

No cenário externo, ele menciona dados mais fracos sobre a inflação ao consumidor e ao produtor na China – grande consumidora de commodities produzidas no Brasil -, acrescentando que o país asiático tem cortado depósitos compulsórios e sinalizado nova redução de juros, para estimular a economia. “O quadro também tem se mostrado mais favorável quanto aos juros americanos. O Fed deve vir com mais um aumento de 25 pontos-base, mas os cortes na taxa podem começar já no segundo semestre, quem sabe ali por agosto também”, diz Faust.

Aqui, com o projetado para o IPCA em 12 meses abaixo de 5%, tira-se parte da pressão sobre o BC quanto à referência a chances de novo aumento de juros ainda pela frente, “acelerando bastante a entrada (de recursos) para Bolsa”, aponta Fabrizio Velloni, economista-chefe da Frente Corretora. Ele destaca também a redução de compulsório na China como outro fator-chave para o apetite por ativos brasileiros na sessão. “A injeção de recursos na economia chinesa ampara visão de aumento da demanda, do consumo de matérias primas, o que favorece o Brasil (na balança comercial e nas transações externas), e especialmente os papéis vinculados a commodities”, acrescenta.

“Além de ter vindo abaixo das expectativas, o IPCA de março também é uma boa notícia do ponto de vista qualitativo, com a média dos núcleos recuando para 0,36%, de 0,72% no anterior. O núcleo de serviços, que serve de proxy para o grau de aquecimento da demanda, também recuou para 0,32%, ante 0,54%”, observa em nota Darwin Dib, economista-chefe da Gauss Capital. “O resultado de hoje deverá ser decisivo para ajudar a estancar a elevação das expectativas de inflação, registradas na pesquisa Focus, pois a variável objetiva que define a trajetória das expectativas é, em última instância, o comportamento da inflação corrente.”

Dólar

A trinca formada por leitura benigna do IPCA de março, menor percepção de risco para a trajetória da dívida pública, com possível adoção de travas ao aumento de gastos no novo arcabouço fiscal, e sinais de vitalidade da economia chinesa alimentou uma onda de valorização dos ativos domésticos na sessão desta terça-feira, 11.

Com relatos de fluxo de recursos estrangeiros para renda fixa e ações locais, em dia de alta de mais de 4% do Ibovespa, e de desmonte de posições defensivas no mercado futuro, o dólar operou em baixa firme ao longo de toda a sessão e chegou a furar o piso de R$ 5,00 pela manhã, com mínima a R$ 4,9899. No fim do pregão, a moeda recuava 1,16%, cotada a R$ 5,0072 – menor valor de fechamento desde 10 de junho de 2022. A divisa já acumula baixa de 1,21% em abril.

Lá fora, o índice DXY – termômetro do desempenho do dólar frente a seis divisas fortes – operou em baixa, flertando com o rompimento da linha dos 102,000 pontos, apesar de avanço dos Treasuries e da expectativa pela divulgação, amanhã, do índice de preços ao consumidor nos EUA em março e da ata do Federal Reserve. A moeda americana caiu em relação à maioria das divisas emergentes e de países exportadores de commodities, com o peso chileno puxando a fila, seguido pelo real.

Pela manhã, o IBGE informou que o IPCA desacelerou de 0,84% em fevereiro para 0,71% em março, abaixo da mediana (0,77%) e perto do piso (0,69%) de Projeções Broadcast. A taxa acumulada em 12 meses é de 4,65%. Cálculos de economistas mostram que a difusão do IPCA desceu da casa de 65% em fevereiro para menos de 60% em março.

O economista-chefe e consultor da Remessa Online, André Galhardo, afirma que a tendência recente de apreciação do real foi reforçada hoje pela leitura do IPCA, que mostra um cenário mais benigno para a inflação. “Os argumentos para o Banco Central manter a Selic em 13,75% são cada vez mais escassos. Mas a inflação deve desacelerar em um ritmo mais rápido do que a potencial velocidade de queda da Selic, o que garante um juro real em nível elevado e ajuda a moeda brasileira”, afirma Galhardo, para quem sinais positivos da China – que hoje divulgou forte aumento de empréstimos bancários – ajudam a atrair recursos externos para a bolsa brasileira e favorecem o real.

O CEO do Transferbank, Luiz Felipe Bazzo, observa que a perspectiva de manutenção de juros ainda altos no Brasil, mesmo com provável redução da Selic, “está atraindo exportadores para o mercado doméstico de renda fixa”, o que reduz o diferencial entre embarques e liquidação financeira. “Com as altas nos juros nos EUA chegando ao fim e o diferencial de juros favorável, o patamar de dólar abaixo de R$ 5,00 pode ser sustentável”, afirma.

Além do IPCA e dos ventos externos positivos, analistas veem uma redução da percepção de risco. Fontes ouvidas pelo Broadcast afirmaram que o texto final da proposta de novo arcabouço fiscal deve limitar em R$ 25 bilhões o bônus para investimentos adicionais. Isso evitaria que aumentos extraordinários das receitas, com geração de superávit primário superior às metas estabelecidas, traduzissem automaticamente em expansão de gastos. Em entrevista ao <i>Broadcast</i> no último dia 6, o secretário do Tesouro Nacional, Rogério Ceron, já havia afirmado que estava em estudo regra que limitasse o valor destinado a investimentos.

Para head de câmbio do Travelex Bank, Marcos Weigt, parece que a equipe econômica “escutou os comentários do mercado e está ajustando” pontos da nova regra fiscal, o que dá fôlego aos ativos domésticos. “O Haddad está se mostrando, digamos, ortodoxo e preocupado realmente com o fiscal. Estão colocando amarras para os gastos e ajustando o arcabouço de forma construtiva. Parece que não tem mais aquele risco de descontrole da relação dívida/PIB”, diz Weigt.

Juros

Os juros futuros encerraram o dia em queda firme, embalados pela leitura positiva do IPCA e pelo apetite por ativos emergentes que também ajudou o Ibovespa a subir mais de 4%. As apostas no ciclo de queda da Selic cresceram e já são majoritárias na precificação do mercado para o Copom de junho.

A taxa do contrato de Depósito Interfinanceiro (DI) para janeiro de 2024 fechou em 13,15%, de 13,22% ontem no ajuste, e a do DI para janeiro de 2025 caiu de 11,99% para 11,80%. O DI para janeiro de 2027 terminou com taxa de 11,77%, de 11,98%, e o DI para janeiro de 2029 fechou com taxa de 12,20%, de 12,38%. Ao contrário de ontem, hoje o volume de contratos negociados foi robusto, com giro de mais de 1,2 milhão no DI para janeiro de 2024, hoje o mais líquido.

O co-gestor de renda fixa da Warren Rena, Luis Felipe Laudisio, afirma que, dado o posicionamento técnico ainda bastante leve, os players adicionaram risco às carteiras. “Até por isso, a B28 foi bastante demandada, com o nível de juro real que parece alto”, disse. A NTN-B 15/8/2028 foi destaque no leilão do Tesouro. Do total de 1,576 milhão de NTN-B vendidas, 1,500 milhão são para aquele vencimento.

Em boa medida, a postura agressiva foi pavimentada pelo arrefecimento do IPCA em março, a 0,71%, ante 0,84% em fevereiro. Em 12 meses, a taxa acumulada caiu de 5,60% para 4,65%, a mais baixa desde janeiro de 2021 e abaixo do teto da meta de inflação (4,75%) para 2023. Mais até do que o fato de o dado mensal ter ficado aquém da mediana (0,77%) e perto do piso das estimativas (0,69%), o mercado gostou do “qualitativo”, em especial da desaceleração dos preços de serviços e dos núcleos, que vinham resistindo até então em alta e dando argumentos para o Banco Central despistar sobre a possibilidade de cortes da Selic.

“Ainda que a queda tenha sido bastante influenciada pelo comportamento dos alimentos, o mercado aumentou a aposta de queda da Selic”, afirmou o economista do BV Carlos Lopes.

Conforme cálculos da BlueLine Asset, os DIs apontam 60% de chance de queda de 0,25 ponto porcentual da Selic no Copom de junho, contra 40% de probabilidade de manutenção no atual nível de 13,75%. Para o Copom de agosto está precificado 100% de chance de redução de 0,25 ponto. Para o fim de 2023, a curva projeta Selic entre 12,00% e 12,25% e para o fim de 2024, de 10,75%.

Outro fator a contribuir para o fechamento da curva foi o câmbio, com o dólar chegando hoje ao patamar de R$ 5, até abaixo pontualmente nas mínimas do dia. No período da tarde, com os trechos curto e intermediários já bastante pressionados para baixo, o investidor foi buscar os prêmios da ponta longa, ignorando as máximas das T-notes.

O gestor de renda fixa da Sicredi Asset, Cassio Xavier Andrade, afirma que o movimento global pró-emergentes, hoje especialmente estimulado por otimismo com a economia da China, atraiu os investidores não só para a Bolsa como também para o segmento de prefixados, além do IPCA.

Ainda, segundo Andrade, o noticiário em torno do arcabouço fiscal tem ajudado marginalmente, assim como a percepção de fortalecimento da equipe econômica dentro do governo, após o presidente Lula elogiar publicamente o ministro da Fazenda, Fernando Haddad. “Parece que as coisas vão se dando de forma menos heterodoxa do que se pensava”, disse.

Fonte Correio do Povo

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