O juiz Cristiano Vilhalba Flores, da 3ª Vara da Fazenda Pública de Porto Alegre, declarou nula, nesta segunda-feira (28), a sessão da Câmara de Vereadores que recebeu a denúncia de impeachment contra o prefeito Nelson Marchezan Júnior. Cabe recurso da decisão.
O chefe do Executivo impetrou mandado de segurança contra a Comissão Processante do Impeachment no Legislativo, afirmando que existem inúmeros vícios no decorrer do processo, “com claro e evidente propósito, em desvio de finalidade, de retirar o impetrante do pleito eleitoral municipal de 2020”.
O juiz já havia concedido liminar suspendendo o processo, até o julgamento do mérito. Na decisão desta segunda, que julgou o mérito do pedido, o magistrado citou a Convenção Americana de Direitos Humanos, que estabelece, sobre garantias judiciais, que “toda pessoa tem direito a ser ouvida, com as devidas garantias e dentro de um prazo razoável, por um juiz ou tribunal competente, independente e imparcial, estabelecido anteriormente por lei, na apuração de qualquer acusação penal formulada contra ela, ou para que se determinem seus direitos ou obrigações de natureza civil, trabalhista, fiscal ou de qualquer outra natureza”.
O primeiro ponto analisado foi o questionamento de Marchezan quanto à necessidade, ou não, de que a Câmara, antes de apreciar o pedido de impeachment protocolado, tivesse enfrentado os processos legislativos que tramitavam com pedido de urgência, por iniciativa do Poder Executivo, há mais de 45 dias.
Conforme o magistrado, a Lei Orgânica de Porto Alegre é bastante clara em determinar que “a não-apreciação de matérias de iniciativa do Poder Executivo municipal, em que se tenha solicitado urgência, veda a apreciação de qualquer outro assunto em plenário, ou seja, até mesmo a deliberação sobre a abertura de processos de impeachment do prefeito municipal. Tema já enfrentado pelo TJ-RS (agravo de instrumento 70078392982) e decidido nestes exatos termos”.
“Demonstrou o impetrante que, por ocasião da votação do recebimento da denúncia contra ele, em 05/08/20, tramitavam projetos, com pedido de urgência, há mais de 45 dias, como, por exemplo, o PLE 008/20, onde existe certidão aduzindo que trancava a pauta desde o dia 10/07/20, sendo que até o ingresso da demanda não havia sido votado. Ainda aduz, o impetrante, haver outros, mas basta um para que surja o obstáculo antes referido”, destacou o juiz.
Atos praticados pela comissão
O segundo ponto analisado pelo magistrado diz respeito aos atos praticados pela Comissão Processante, destacando-se: a não efetiva apreciação da defesa do impetrante e a vedação de participação de seu advogado na sessão em que fora votado o parecer pelo prosseguimento do processo.
Para o juiz, o advogado de Marchezan estava presente na sessão e teve sua atuação vedada por ato da presidência, infringindo garantias fundamentais constitucionais e convencionais.
“O argumento de que tal irregularidade estaria convalidada por não ter sido demonstrado o prejuízo também não convence. O prejuízo decorre simplesmente da negativa de participação – que não seja apenas formal e presencial – no ato, quando uma série de questionamentos e questões preliminares aparentemente pretendia a defesa invocar. Como não houve sequer a possibilidade de participação efetiva pela defesa técnica na reunião, não se é possível vislumbrar a linha defensiva que seria tomada. Ademais disso, o ato arbitrário, em si, já fere as garantias fundamentais da ampla defesa e do contraditório de tal maneira que o prejuízo à condução de um processo justo e imparcial é evidente”, afirmou Vilhalba Flores.
Testemunhas
No pedido, Marchezan também questionou o número de testemunhas no processo. Conforme o magistrado, o Código de Processo Civil permite que até dez testemunhas sejam arroladas, mas que até três sejam efetivamente ouvidas para provar cada fato.
“Para estipular-se o número máximo de testemunhas no caso concreto que é submetido à decisão judicial, necessário se ingressar na análise dos fatos que são imputados como crime de responsabilidade ao impetrante. E, da leitura da denúncia, extrai-se dois, e não três, fatos a ele contrapostos”, afirmou o magistrado
Conforme o juiz, o primeiro fato diz respeito à suposta ilegalidade na transferência de recursos do Fundo Municipal da Saúde para a realização de publicidade, sendo que as consequentes sanções são embasadas nos art. 1º, incs. III, IV e V e art. 4º, inc. VII, ambos do Decreto-lei 201/67.
O segundo fato diz respeito à acusação de ter sido a propaganda realizada fora de Porto Alegre, em desrespeito ao art. 125, §2º e § 8º, da Lei Orgânica do Município de Porto Alegre.
Quanto ao um terceiro fato que Marchezan afirmou ser acusado, na execução do contrato, por sua celeridade descabida, o juiz disse que “não se apresenta destacado dos demais, não havendo uma sanção legal específica com relação a ele, servindo, em realidade, de reforço argumentativo”.
“Disto decorre a conclusão de que o impetrante tem o direito legal de arrolar dez testemunhas por fatos que lhes são imputados, no caso, dois, podendo indicar até 20 testemunhas, mas demonstrando a correlação com estes individualmente, sendo ouvidas dentro de critérios de razoabilidade e proporcionalidade”, decidiu o juiz.
(O Sul)