Remédio testado e aprovado contra covid-19 custa US$ 3.120

Remédio testado e aprovado contra covid-19 custa US$ 3.120

A Gilead Sciences, fabricante do primeiro tratamento para a covid-19 que funcionou em ensaios clínicos, disse nesta segunda-feira, 29, que cobrará aos hospitais dos Estados Unidos US$ 3.120 pelo paciente típico com seguro privado.

Logo após o anúncio, o governo Trump disse que havia garantido quase todo o suprimento da empresa para uso em hospitais americanos até setembro, com um contrato para 500 mil ciclos de tratamento, que disponibilizará aos hospitais pelo preço da Gilead.

Outros países desenvolvidos pagarão 25% menos que os Estados Unidos, um desconto que a Gilead disse refletir a necessidade de tornar o medicamento o mais amplamente disponível possível em todo o mundo.

A empresa licenciou fabricantes de genéricos para produzir o medicamento para países em desenvolvimento que receberão o tratamento “a um custo substancialmente mais baixo”, afirmou a empresa.

O anúncio da Gilead resolve uma questão persistente acerca de um medicamento que demonstrou ter um benefício modesto, mas continua sendo a única medicação autorizada pela Food and Drug Administration (FDA, agência que regulamenta medicamentos nos Estados Unidos) para tratar pacientes hospitalizados com covid-19.

O ensaio clínico patrocinado pelo governo mostrou que o medicamento — criado pela Gilead, mas desenvolvido em grande parte por agências financiadas pelos contribuintes — acelerou as recuperações hospitalares em quatro dias. Não teve impacto estatisticamente significativo na sobrevida de pacientes com covid-19.

Estabelecer um preço para um novo medicamento no meio de uma pandemia representava um desafio sem precedentes, disse a Gilead. Cortar quatro dias de custos hospitalares para cada paciente significa uma economia de US$ 12 mil para o sistema de saúde dos Estados Unidos, disse a empresa. Com base nessa referência, a Gilead sugeriu que isso poderia ter justificado um preço mais alto.

“Como em muitos aspectos dessa pandemia, estamos em um território desconhecido ao precificar o remdesivir”, escreveu o presidente e CEO da Gilead, Daniel O’Day, em uma carta aberta na segunda-feira. “À medida que o mundo continua se chocando com o impacto humano, social e econômico dessa pandemia, acreditamos que atribuir o preço do remdesivir bem abaixo do valor é a coisa certa e responsável a se fazer. ”

A Gilead disse que gastará US$ 1 bilhão para desenvolver e fabricar o remdesivir até o final de 2020. A empresa inventou o medicamento cerca de 10 anos atrás, quando procurava tratamentos para a hepatite C, mas não o desenvolveu. Mais tarde, o potencial do medicamento como antiviral para doenças emergentes foi explorado por meio de uma parceria com o governo. Os contribuintes gastaram pelo menos US$ 70 milhões com o desenvolvimento do medicamento, de acordo com os defensores.

Uma análise independente realizada na semana passada pelo Institute for Clinical and Economic Review disse que a Gilead poderia recuperar seus custos distribuindo o medicamento por preços entre US$ 1 a US$ 60 por dose, ou US$ 100 a US$ 160 por dose, se todos os custos da empresa em 2020 fossem levados em consideração .

De acordo com os preços de segunda-feira, a Gilead fixou o preço em US$ 520 por dose nos Estados Unidos e US$ 390 por dose em outros países desenvolvidos. A Gilead disse que são necessárias seis doses, enquanto o Departamento de Saúde e Serviços Humanos dos Estados Unidos (HHS, na sigla em inglês) disse que estava usando uma média de 6,25 frascos em seus custos estimados para hospitais.

Membros do Congresso e defensores dos consumidores disseram na segunda-feira que a Gilead estava tentando lucrar injustamente com uma invenção apoiada pelos contribuintes em meio a uma pandemia.

“Estamos no meio de uma crise de saúde global”, disse a deputada democrata do Colorado Diana DeGette, que preside o Comitê de Supervisão e Investigações de Energia e Comércio. “Precisamos garantir que qualquer tratamento com potencial para salvar vidas esteja disponível para todos aqueles que precisam, não apenas para quem pode pagar.”

O deputado democrata do Texas Lloyd Doggett disse que a Gilead estabeleceu “um preço ultrajante para um medicamento muito modesto, cujo financiamento dos contribuintes a fez economizar após uma série de falhas”. Ele criticou o governo Trump por não exigir um preço mais baixo em seu contrato para os primeiros 500 mil ciclos de tratamento.

“Em uma demonstração grotesca de arrogância e desrespeito ao público, a Gilead precificou em vários milhares de dólares um medicamento que deveria ser de domínio público”, disse Peter Maybarduk, diretor do grupo sem fins lucrativos para o acesso a medicamentos Public Citizen. “A Gilead não fez o remdesivir sozinha. O financiamento público foi indispensável em cada estágio, e os cientistas do governo lideraram a equipe de descoberta do medicamento. Permitir que a Gilead estabelecesse os termos durante uma pandemia representa um colossal fracasso de liderança por parte do governo Trump.”

Até setembro, o HHS distribuirá o medicamento aos departamentos estaduais de saúde com base no número de pacientes hospitalizados com covid-19, informou a agência. Os departamentos estaduais de saúde, então, distribuirão o medicamento para hospitais com base na necessidade – o mesmo processo que o HHS empregou para uma doação de 120 mil ciclos de tratamento do medicamento, cuja distribuição final será feita na segunda-feira.

“Na medida do possível, queremos garantir que qualquer paciente americano que precise de remdesivir possa recebê-lo”, disse o secretário do HHS, Alex Azar, em comunicado. “O governo Trump está fazendo tudo ao nosso alcance para aprender mais a respeito da medicação que salva vidas no combate a covid-19 e para garantir o acesso a essas opções ao povo americano”.

A demanda por remdesivir aumentou depois que o National Institutes of Health anunciou em 29 de abril que um ensaio clínico havia mostrado que pacientes hospitalizados com covid-19 avançado que receberam o medicamento experimental se recuperaram mais rapidamente do que pacientes semelhantes que receberam um placebo. Dois dias depois, a FDA, citando esses resultados, aprovou o medicamento para tratar pacientes graves.

Os casos confirmados de coronavírus dispararam nas últimas semanas e as autoridades de saúde alertaram no domingo que a janela estava se fechando para impedir a propagação do vírus. O número de casos confirmados ultrapassou 2,5 milhões no domingo, com uma nova e esmagadora onda de infecções continuando a atingir todo o sul e oeste dos Estados Unidos. Em todo o país, 40.587 novos casos diários foram relatados.

Flórida, Texas e Arizona estão emergindo como os mais recentes epicentros do país depois de relatar números recordes de novas infecções por semanas seguidas. As taxas de resultados positivos para o novo coronavírus e de hospitalizações também aumentaram. No domingo, o Arizona e a Geórgia atingiram novos recordes no número de casos em um dia.

O HHS provavelmente enviará a primeira remessa dos 500 mil ciclos de tratamento em cerca de duas semanas, disse uma autoridade sênior do HHS em uma videoconferência com repórteres. A agência analisa o número de hospitalizações todos os dias, disse o funcionário, mas faz uma “análise mais profunda” a cada duas semanas. O plano atual é examinar atentamente a distribuição de pacientes hospitalizados em todo o país em uma semana e começar a direcionar para onde a primeira remessa deve ir.

O remdesivir deve ser administrado por via intravenosa, o que limitou seu uso a pacientes hospitalizados com progressão significativa da covid-19. A empresa está testando um formato que possa ser inalado, o que permitiria que os pacientes o usassem em casa, no início da doença, quando poderia ter um benefício maior.

Enquanto isso, um esteroide barato demonstrou ter um benefício maior na taxa de mortalidade de pacientes em hospitais. O medicamento que existe há 60 anos, dexametasona, reduziu em um terço o risco de morte de pacientes em ventiladores e reduziu em um quinto o risco de morte de pacientes em oxigênio, de acordo com um estudo publicado na Lancet em 16 de junho. /TRADUÇÃO DE ROMINA CÁCIA

Fonte: Terra/Estadao conteudo/Yasmeen Abutaleb, Hannah Denham e Christopher Rowland

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